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EM ATENAS, “UMA FORÇA IRRESISTÍVEL DEFRONTA-SE CONTRA UM OBJECTO IMÓVEL”: BRUXELAS – por MARICA FRANGAKIS

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Falareconomia1

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

mapagrecia

Em Atenas , « uma força irresistível defronta-se contra um objecto imóvel” : Bruxelas.

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Alexis Tsipras, o líder  de Syriza, no dia  25 Janeiro de  2015 frente aos seus apoiantes em Atenas. Foto: Aris Messinis AFP.

Enquanto que as discussões entre os ministros das Finanças, membros do Eurogrupo e o governo de Alexis Tsipras parecem estar bloqueadas, as duas lógicas parecem irreconciliáveis.

Marica Frangakis

Marica Frangakis

Por  Marica Frangakis*, À Athènes, «une force irrésistible rencontre un objet immobile»: Bruxelles,

Libération, 18 de Fevereiro de 2015

“Uma força irresistível encontra-se face a um objecto imóvel”, é assim que Vasilis Gionakis, o chefe da estratégia mundial de câmbios do banco UniCredit, caracteriza as negociações actuais entre os responsáveis do governo grego e o Eurogrupo. “A força irresistível”, é a necessidade profunda expressa pelos eleitores gregos de se repararem os estragos sociais gerados pela política de austeridade em resposta à crise. “O objecto imóvel”, é o apoio do governo alemão à esta política de austeridade por razões ideológicas.

Pela primeira vez desde o início da crise em 2007-2008, que é contestado o projecto dos dirigentes europeus de impor de maneira hegemónica a austeridade como resposta à crise. Os limites do regime da moeda única e as injustiças geradas por esta resposta à crise,  assente numa política de forte austeridade,  foram já muito debatidos, ao mesmo tempo na literatura económica crítica, mas também em inúmeros fóruns por diversos actores sociais, como os sindicatos e os movimentos sociais. Contudo, não existia até agora nenhuma força política organizada capaz de concretizar este discurso público em actos de governo. O novo governo conduzido por Syriza na Grécia (a coligação da esquerda radical) oferece esta oportunidade, e é a razão pela qual encontra uma oposição tão vigorosa dos partidários da austeridade.

As eleições nacionais antecipadas de 25 de Janeiro na Grécia conduziram a uma vitória inequívoca de Syriza, que obteve 36,3% dos votos e 149 lugares no Parlamento (sobre um total de 300). Por seu lado, os partidos do governo de coligação em exercício até aí – a Nova Democracia conservadora e o PASOK socialista – sofreram uma pesada derrota. Estes  dois grupos políticos somaram apenas 32,5% dos sufrágios (respectivamente 27,8% e 4,7%). Syriza não obteve a maioria absoluta, formou um governo de coligação com AN.EL (Grego independente), um partido de direita que se opõe como Syriza ao facto que as ajudas europeias sejam subordinadas à políticas de austeridade como foi o caso em 2010 e 2012

As prioridades do novo governo, que obteve um voto de confiança no Parlamento grego a 11 de Fevereiro, são as seguintes:

  • Crise humanitária – tendo em conta os efeitos socialmente destrutivos da crise sobre largas camadas da população, o governo comprometeu-se a fornecer um acesso gratuito à electricidade, ao alojamento e aos cuidados de saúde para as categorias da população mais atingidas.

  • Leis sobre o trabalho – as negociações colectivas, cujos efeitos tinham sido suspensos em 2011, serão reintroduzidas e a protecção do emprego, que tinha sido desmantelada, será reforçada. O salário mínimo voltará a ter em dois anos o seu nível de antes de 2011.

  • Privatização – as vendas maciças de activos públicos serão paradas.

  • Bancos – uma nova lei será introduzida para parar com os procedimentos de execução das hipotecas pelos bancos enquanto os empréstimos “não performantes, ou seja, que de momento são de cobrança dificil ” – que representam mais de 30% do total dos empréstimos – serão transferidos para uma entidade governamental específica, o que permitirá ajudar as famílias e as empresas, bem como o sector bancário.

  • Reforma fiscal – o governo comprometeu-se, por um lado, a combater a fraude e a evasão fiscal e, por outro lado, a tornar o sistema fiscal menos regressivo que actualmente.

  • Corrupção – uma atenção especial será dada às práticas do sector público que alimentam a corrupção. Por exemplo, haverá inquéritos sobre os contratos públicos logo que haja provas de irregularidades de qualquer que seja a sua natureza.

  • Finanças públicas – no que diz respeito às finanças públicas, o governo conduzido por Syriza declarou que quer ser capaz de poder emitir mais dívida a curto prazo ( títulos do Tesouro comprados pelos bancos gregos), bem para além do limiar actual dos 15 mil milhões de euros. Pede o reembolso dos benefícios (de um montante de 1,9 mil milhões de euros) realizados sobre as obrigações gregas detidas pelo BCE e os outros bancos centrais da zona euro. Por último, deseja reduzir o objectivo de excedente do saldo público primário (saldo das contas públicas com exclusão dos juros da dívida pública) de 4,5% do PIB – como nos acordos actuais “de resgate” – para 1,5%, a fim de libertar margens de manobra orçamentais para pôr em prática a sua política e dar respostas à crise humanitária.

Sendo dado que, nos seus princípios, o programa de Syriza é muito diferente do acordo de resgate aceite pelo governo precedente, o novo governo recusou receber a próxima fracção do plano de ajuda de um montante de 7,2 mil milhões de euros, recusando a ideia de um exame da sua situação pela Troika. O governo grego está sobretudo à procura de uma solução de transição, a fim de lhe permitir desencadear negociações sérias com os seus parceiros da zona euro na perspectiva de pôr em lugar um novo acordo.

Após mais de dez dias de discussões oficiais entre o governo grego e os seus parceiros da zona euro, o impasse parece ser total. A ideia de uma saída da Grécia da zona euro (o Grexit) é de novo evocada, o que exacerba a volatilidade dos mercados financeiros, com a consequência de um aumento das taxas de juro sobre os títulos públicos e uma queda sem precedentes das cotações da Bolsa. Ninguém está em condições de dizer por quanto tempo esta impasse pode durar, nem o que pode vir a provocar. No momento actual em que o ministro alemão das finanças Wolfgang Schauble critica o eleitorado grego por “ter eleito um governo que, actualmente, se comporta de maneira irresponsável”, estão reunidas milhares de pessoas nas praças de Atenas e noutras cidades, na Grécia e na Europa, a fim de exigir o fim da austeridade e exprimir o seu apoio ao governo grego na continuação das negociações. Como Joseph Stiglitz muito bem sublinhou, “é raro que eleições democráticas dêem uma mensagem tão clara como na Grécia.”

Marica Frangakis, A Athènes, «une force irrésistible rencontre un objet immobile»: Bruxelles. Texto disponível em:

http://leseconomistesatterres.blogs.liberation.fr/2015/02/18/une-force-irresistible-rencontre-un-objet-immobile/

* Marica Frangakis é economista, membro  do Grupo  Euro-PEN (European Progressives Economists Network) et do Instituto  Nicos Poulantzas.


Filed under: Economia, Política Tagged: economistas aterrados, eurogrupo, grécia, júlio marques mota, libération, marica frangakis, syriza

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